I became the butterfly. I got out of the cocoon, and I flew.
Lynn Redgrave
sábado, 29 de setembro de 2007
sexta-feira, 28 de setembro de 2007
...tirei da boca um pássaro...
Entrei no café com um rio na algibeira
e pu-lo no chão,
a vê-lo correr
da imaginação...
A seguir, tirei do bolso do colete
nuvens e estrelas
e estendi um tapete
de flores
a concebê-las.
Depois, encostado à mesa,
tirei da boca um pássaro a cantar
e enfeitei com ele a Natureza
das árvores em torno
a cheirarem ao luar
que eu imagino.
E agora aqui estou a ouvir
A melodia sem contorno
Deste acaso de existir
-onde só procuro a Beleza
para me iludir
dum destino.
José Gomes Ferreira
Foram pétalas
Foram pétalas
Ou olhos de deusas
Que calquei?
Não,
Não me digam
Eu sei
Que foram Sonhos
Foram pétalas
Daniel Faria In “Poesia”
No meio do caminho...
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
No meio do caminho - Carlos Drummond de Andrade
The mission of photography...
The mission of photography is to explain man to man and each to himself. And that is the most complicated thing on earth.
Edward Steichen
terça-feira, 25 de setembro de 2007
Sê
Sê"
Se não puderes ser um pinheiro, no topo de uma colina,
Sê um arbusto no vale mas sê
O melhor arbusto à margem do regato.
Sê um ramo, se não puderes ser uma árvore.
Se não puderes ser uma ramo, sê um pouco de relva
E dá alegria a algum caminho.
Se não puderes ser uma estrada,
Sê apenas uma senda,
Se não puderes ser o Sol, sê uma estrela.
Não é pelo tamanho que terás êxito ou fracasso...
Mas sê o melhor no que quer que sejas.
Pablo Neruda
Everyone, when they are young...
..."Everyone, when they are young, knows what their destiny is. At that point in their lives, everything is clear and everything is possible. They are not afraid to dream, and to yearn for everything they would like to see happen to them in their lives."
The Alchemist: A Fable About Following Your Dream
Paulo Coelho
segunda-feira, 24 de setembro de 2007
Mar de Setembro
Tudo era claro:
céu, lábios, areias.
O mar estava perto,
Fremente de espumas.
Corpos ou ondas:
iam, vinham, iam,
dóceis, leves, só
alma e brancura.
Felizes, cantam;
serenos, dormem;
despertos, amam,
exaltam o silêncio.
Tudo era claro,
jovem, alado.
O mar estava perto,
puríssimo, doirado.
Eugénio de Andrade
Retrato
O teu retrato
É não sentir na alma
A nostalgia do crepúsculo!
O teu retrato
É sentir que a tarde se esfumou
Como a neblina que caiu sobre a cidade
E rapidamente desapareceu!
O teu retrato
É não sentir na carne
A cicatriz da dor!
O teu retrato és tu . . . Sou eu!
Nós dois . . . Entrelaçados
No mesmo ideal de sangue e de vitória
Para sempre!
Retrato de José Carlos Tavares de Melo in On a Leaf of Blue
domingo, 23 de setembro de 2007
Da minha aldeia
Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não, do tamanho da minha altura...
Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.
Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave,
Escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para longe
de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos
nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver.
Da Minha Aldeia - Alberto Caeiro
A alpinista
Afasta-te silenciosamente em qualquer
direcção e saboreia a liberdade do
alpinista...Sobe às montanhas e escuta
a sua boa nova. A paz da natureza
inundar-te-á como o sol inunda as árvores.
Os ventos comunicar-te-ão a sua frescura
e as tempestades a sua energia, enquanto
as preocupações cairão quais folhas outonais.
John Muir
The butterfly...
I touch God in my song
as the hill touches the far-away sea
with its waterfall.
The butterfly counts not months but moments,
and has time enough.
Rabindranath Tagore
O perfume
O que sou eu? – O Perfume,
Dizem os homens. – Serei.
Mas o que sou nem eu sei...
Sou uma sombra de lume!
Rasgo a aragem como um gume
De espada: Subi. Voei.
Onde passava, deixei
A essência que me resume.
Liberdade, eu me cativo:
Numa renda, um nada, eu vivo
Vida de Sonho e Verdade!
Passam os dias, e em vão!
– Eu sou a Recordação;
Sou mais, ainda: a Saudade.
O perfume - António Correia de Oliveira
Das pedras
Ajuntei todas as pedras
que vieram sobre mim.
Levantei uma escada muito alta
e no alto subi.
Teci um tapete floreado
e no sonho me perdi.
Uma estrada,
um leito,
uma casa,
um companheiro.
Tudo de pedra.
Entre pedras
cresceu a minha poesia.
Minha vida...
Quebrando pedras
e plantando flores.
Entre pedras que me esmagavam
Levantei a pedra rude
dos meus versos.
Das Pedras - Cora Coralina
If you take a picture...
If you take a picture of a human that does not make him noble, there is no reason to take this picture. That is my way of seeing things.
Sebastião Salgado
quarta-feira, 19 de setembro de 2007
O lugar da Casa
Uma casa que fosse um areal
deserto; que nem casa fosse;
só um lugar
onde o lume foi aceso, e à sua roda
se sentou a alegria; e aqueceu
as mãos; e partiu porque tinha
um destino; coisa simples
e pouca, mas destino:
crescer como árvore, resistir
ao vento, ao rigor da invernia,
e certa manhã sentir os passos
de abril
ou, quem sabe?, a floração
dos ramos, que pareciam
secos, e de novo estremecem
com o repentino canto da cotovia.
O lugar da Casa - Eugénio de Andrade
terça-feira, 18 de setembro de 2007
Tempus Fugit
Saudade duma infância tão distante,
Dum mundo que o destino já levou,
Aurora que recordo a cada instante
No poente que o Tempo me deixou.
Outrora a vida era um jardim fragante,
Mas o vento logo o despedaçou,
Tropel de calendários, delirante,
Relâmpago instantâneo que voou.
Meus tesouros perdi-los p'lo caminho,
Só me resta a cabeça cor de linho,
Inverno de quem sofre e de quem ama.
Quem és tu, saudade dolorida,
És o eco que repete o som da vida,
Ou és a voz da morte que nos chama?
Tempus Fugit - Ramiro Dutra
domingo, 16 de setembro de 2007
Soneto
Soneto
Carregado de mim ando no mundo,
E o grande peso embarga-me as passadas,
Que como ando por vias desusadas,
Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.
O remédio será seguir o imundo
Caminho, onde dos mais vejo as pisadas,
Que as bestas andam juntas mais ousadas,
Do que anda só o engenho mais profundo.
Não é fácil viver entre os insanos,
Erra, quem presumir que sabe tudo,
Se o atalho não soube dos seus danos.
O prudente varão há de ser mudo,
Que é melhor neste mundo, mar de enganos,
Ser louco c'os demais, que só, sisudo.
- Gregório de Matos
sábado, 15 de setembro de 2007
Heaven is...
Heaven is what I cannot reach!
The apple on the tree,
Provided it do hopeless hang,
That "heaven" is, to me.
The color on the cruising cloud,
The interdicted ground
Behind the hill, the house behind, --
There Paradise is found!
Emily Dickinson
Num dia...
"NUM DIA DE FINGIDA TRANSUMÂNCIA
eu, pássaro materno dos país,
levarei nas asas
o verão descuidado
e as palavras que devem ser ouvidas.
Oh! tempo essencial
na alvorada irei colher
sob o arco da ponte adormecida
as bicadas do orvalho;
no caule da sombra
retrato do meu caminho,
apelarei para a luz
eu, pássaro-poeta
que viu René(*)
inaugurar seu voo numa rajada de vento."
Jean-Albert Guénégan
(*) René Guy Cadou
These, the people of the island
These are the people born from the ocean. Their blood
came from salt. Their veins have floated
between wigs of seaweed and funguses of basalt.
their mouths opened within the remote forgetfulness
of the seashells. Memory is the deserted shell
the rolled sandy boulder on the cliff.
Generated maybe between the sickly calling of the wales
and the semblances of the ships. Because these people
(re)cognize themselves between sand and sea
in the precise moment that the rock
and the body touch each other and love
the water.
And that is why fish swim
trough our eyes
they travel between us and us and the certainty
of the body.
These, the people of the island de João de Melo in On a Leaf of Blue
sexta-feira, 14 de setembro de 2007
Why do colors...
Why do two colors, put one next to the other, sing? Can one really explain this? no. Just as one can never learn how to paint.
Pablo Picasso
When I am alone I am happy...
When I am alone I am happy.
The air is cool. The sky is
flecked and splashed and wound
with color. The crimson phalloi
of the sassafras leaves
hang crowded before me
in shoals on the heavy branches.
When I reach my doorstep
I am greeted by
the happy shrieks of my children
and my heart sinks.
I am crushed.
Are not my children as dear to me
as falling leaves or
must one become stupid
to grow older?
It seems much as if Sorrow
had tripped up my heels.
Let us see, let us see!
What did I plan to say to her
when it should happen to me
as it has happened now?
William Carlos Williams
The curves...
”i am not attracted to straight angles or to the straight line, hard and inflexible, created by man. i am attracted to free-flowing, sensual curves. the curves that i find in the mountains of my country, in the sinuousness of its rivers, in the waves of the ocean, and on the body of the beloved woman. curves make up the entire universe, the curved universe of einstein.”
(Oscar Niemeyer)
A concha
"A minha casa é concha. Como os bichos
Segreguei-a de mim com paciência:
Fechada de marés, a sonhos e a lixos,
O horto e os muros só areia e ausência.
Minha casa sou eu e os meus caprichos.
O orgulho carregado de inocência
Se às vezes dá uma varanda, vence-a
O sal que os santos esboroou nos nichos.
E telhadosa de vidro, e escadarias
Frágeis, cobertas de hera, oh bronze falso!
Lareira aberta pelo vento, as salas frias.
A minha casa... Mas é outra a história:
Sou eu ao vento e à chuva, aqui descalço,
Sentado numa pedra de memória.
A Concha - Vitorino Nemésio
quinta-feira, 13 de setembro de 2007
Cabelos
Ó vagas de cabelos esparsas longamente,
Que sois o vasto espelho onde eu me vou mirar,
E tendes o cristal dum lago refulgente
E a rude escuridão dum largo e negro mar;
Cabelos torrenciais daquela que me enleva,
Deixai-me mergulhar as mãos e os braços nus
No báratro febril da vossa grande treva,
Que tem cintilações e meigos céus de luz.
Deixai-me navegar, morosamente, a remos,
Quando ele estiver brando e livre de tufões,
E, ao plácido luar, ó vagas, marulhemos
E enchamos de harmonia as amplas solidões.
Deixai-me naufragar no cimo dos cachopos
Ocultos nesse abismo ebânico e tão bom
Como um licor renano a fermentar nos copos,
Abismo que se espraia em rendas de Alençon!
E ó mágica mulher, ó minha Inigualável,
Que tens o imenso bem de ter cabelos tais,
E os pisas desdenhosa, altiva, imperturbável,
Entre o rumor banal do hinos triunfais;
Consente que eu aspire esse perfume raro,
Que exalas da cabeça erguida com fulgor,
Perfume que estonteia um milionário avaro
E faz morrer de febre um pobre sonhador.
Eu sei que tu possuis balsâmicos desejos,
E vais na direcção constante do querer,
Mas ouço, ao ver-te andar, melódicos harpejos,
Que fazem mansamente amar e enlanguescer.
E a tua cabeleira, errante pelas costas,
Suponho que te serve, em noites de Verão,
De flácido espaldar aonde te recostas
Se sentes o abandono e a morna prostração.
E ela há-de, ela há-de, um dia, em turbilhões insanos,
Nos rolos envolver-me e armar-me do vigor
Que antigamente deu, nos circos dos romanos,
Um óleo para ungir o corpo ao gladiador.
Cabelos - Cesário Verde
quarta-feira, 12 de setembro de 2007
All the world's a stage...
All the world's a stage, and all the men and women merely players: they have their exits and their entrances; and one man in his time plays many parts, his acts being seven ages.
William Shakespeare
Fiz um conto para me embalar
Fiz com as fadas uma aliança.
A deste conto nunca contar.
Mas como ainda sou criança
Quero a mim própria embalar.
Estavam na praia três donzelas
Como três laranjas num pomar.
Nenhuma sabia para qual delas
Cantava o príncipe do mar.
Rosas fatais, as três donzelas
A mão de espuma as desfolhou.
Nenhum soube para qual delas
O príncipe do mar cantou.
Fiz um conto para me embalar - Natália Correia
Há-de flutuar uma cidade...
há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida
pensava eu... como seriam felizes as mulheres
à beira mar debruçadas para a luz caiada
remendando o pano das velas espiando o mar
e a longitude do amor embarcado
por vezes
uma gaivota pousava nas águas
outras era o sol que cegava
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite
os dias lentíssimos... sem ninguém
e nunca me disseram o nome daquele oceano
esperei sentado à porta... dantes escrevia cartas
punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua
assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar
se espantasse com a minha solidão
(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no
coração. mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)
um dia houve
que nunca mais avistei cidades crepusculares
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta
inclino-me de novo para o pano deste século
recomeço a bordar ou a dormir
tanto faz
sempre tive dúvidas que alguma vez me visite a felicidade
Há-de flutuar uma cidade... - Al Berto